
Tecnologia sozinha não basta. O papel das pessoas na gestão da jornada
26 de agosto de 2025Motoristas são a base do transporte rodoviário de cargas, mas a profissão que mantém o Brasil em movimento está em crise. O número de motoristas diminui ano após ano, a idade média da categoria sobe, e os jovens não veem atrativos para seguir essa profissão. Se nada mudar, esse problema vai se agravar, com impactos sobre eficiência, custos, segurança e sustentabilidade para todas as transportadoras.
De acordo com Dados do Instituto de Logística e Supply Chain (ILOS), entre 2014 e 2024, o Brasil perdeu cerca de 1,1 milhão de motoristas de caminhão, uma queda de aproximadamente 20% no total de profissionais ativos no setor.
Com isso, foi levantado que apenas 4,11% dos motoristas tinham até 30 anos de idade, enquanto mais de 11% já ultrapassam os 70 anos. Deixando com que a maior parte dos motoristas esteja concentrada nas faixas etárias entre 51 e 70 anos. O que evidencia um envelhecimento acelerado da categoria. Isso significa que a renovação da profissão não está acontecendo na mesma velocidade em que os motoristas deixam as estradas, abrindo uma lacuna perigosa para o futuro do transporte rodoviário.
Por que os jovens estão evitando a estrada
A nova geração que está entrando no mercado de trabalho é a geração Z, jovens que nasceram em um mundo digital, conectados, que valorizam flexibilidade, qualidade de vida e propósito nas escolhas profissionais. No entanto, quando olham para a profissão de motorista de caminhão, poucos se sentem atraídos. Isso ajuda a explicar por que o setor enfrenta dificuldades em renovar seus quadros e garantir sucessores para os motoristas que estão se aposentando.
Mas afinal, por que esses jovens estão evitando a estrada?
- Condições de trabalho difíceis: longas viagens, muitas horas longe de casa e descanso irregular ou dividido. Para uma geração que valoriza equilíbrio e bem-estar, isso se torna pouco atrativo.
- Baixa atratividade econômica: especialmente para autônomos, os custos com manutenção, combustível e desgaste do veículo reduzem bastante a margem de lucro.
- Modelo de contratação incerto: falta de benefícios claros, estabilidade e perspectivas de carreira afasta ainda mais os jovens, que dão grande importância à segurança profissional.
- Imagem da profissão: carreiras ligadas à tecnologia, inovação e rotinas mais flexíveis chamam mais atenção dessa geração. Já a vida na estrada, com sacrifícios e imprevisibilidade, não combina com suas expectativas de futuro.
- Custo de entrada alto: tirar a habilitação adequada, adquirir ou manter um caminhão e lidar com os custos iniciais são barreiras para quem está começando.
- Falta de segurança: estradas precárias, alto índice de acidentes e o risco de roubos de carga tornam a profissão ainda menos atrativa. Para jovens que prezam pela segurança física e emocional, isso pesa muito na decisão de não seguir a carreira.
A geração Z busca propósito, tecnologia, estabilidade e qualidade de vida. Enquanto a profissão de motorista continuar associada a riscos, sacrifícios e baixa valorização, será cada vez mais difícil atrair novos talentos para as estradas.
Quais são as consequências se nada for feito
Se nada for feito para mudar essa realidade, em pouco tempo enfrentaremos uma escassez crítica de motoristas. Isso impacta diretamente toda a economia e o transporte rodoviário, responsável por mais da metade da movimentação de cargas no país. As consequências são graves: menos motoristas disponíveis significam atrasos nas entregas, aumento de custos e dificuldade para atender à demanda, criando um verdadeiro gargalo logístico que afeta empresas e consumidores.
Além disso, os custos operacionais tendem a crescer. Para suprir a carência de profissionais, transportadoras podem ter que pagar mais horas extras, recorrer a prestadores terceirizados ou até assumir prejuízos com multas. O risco jurídico também aumenta, já que jornadas mal planejadas, descanso irregular e condições de trabalho adversas abrem espaço para processos trabalhistas e fiscais.
No fim, tudo isso resulta em perda de competitividade. Empresas que não se adaptarem a esse cenário terão mais custos, menos eficiência e dificuldade para competir em um mercado cada vez mais exigente.
Como podemos mudar essa realidade
Para reverter esse cenário, é essencial promover mudanças que melhorem a qualidade de vida dos motoristas e tornem a profissão mais atrativa para as novas gerações que buscam uma carreira. Essas transformações não dependem apenas das transportadoras, mas também de políticas públicas eficazes. Por isso, cabe a todos nós cobrar e exigir avanços que garantam condições de trabalho mais justas, seguras e sustentáveis para quem move o país pelas estradas.
- Melhorar as condições de trabalho
- Jornada mais justa, descanso garantido, boa infraestrutura nas estradas.
- Programas de saúde, apoio psicológico, estrutura para pernoite, alimentação adequada.
- Remuneração e incentivos mais atraentes
- Oferecer remuneração que reflita todos os custos do motorista.
- Benefícios: seguro, estabilidade mínima, bonificações por desempenho, compensações por viagem distante.
- Modelos de contrato mais seguros e claros
- Para autônomos: contratos que dão visibilidade, garantias mínimas.
- Para CLT: estrutura de carreira, treinamento, evolução profissional.
- Formação, capacitação e atração de jovens
- Parceiras com escolas técnicas e programas de formação.
- Campanhas de valorização da profissão.
- Incentivar a entrada de mulheres no setor, crescimento da diversidade.
- Uso de tecnologia e gestão eficiente
- Melhor planejamento de rotas, rastreamento, controle de jornada para evitar fadiga e desperdícios.
- Automatizar processos que tornam a vida do motorista mais fácil (marcação, pausas, monitoramento).
- Ferramentas que ajudem no suporte e comunicação com o motorista.
O que transportadoras podem fazer agora
Se você já está sentindo os efeitos dessa crise e quer preparar sua transportadora para o futuro, o momento de agir é agora. Algumas ações simples podem fazer toda a diferença:
- Avaliar a idade média da sua frota de motoristas: entenda quantos já estão próximos da aposentadoria e prepare um plano de renovação.
- Identificar quantos motoristas jovens você tem e quais barreiras estão dificultando a atração desse perfil (salário, estabilidade, conforto).
- Mapear os custos e benefícios de melhorar a jornada e as condições de trabalho, calculando se pagar mais hoje pode representar economia e maior performance no longo prazo.
- Implementar tecnologias que apoiem a jornada, como controle de descanso, rastreamento e comunicação eficaz, trazendo mais segurança e previsibilidade para a operação.
- Promover uma cultura interna que valorize os motoristas, reconhecendo bons exemplos e incentivando o cumprimento correto da jornada.
Essas medidas não são apenas um investimento em pessoas, mas também em eficiência, segurança e competitividade. Transportadoras que começarem a agir agora estarão mais preparadas para enfrentar os desafios do futuro e conquistar espaço em um mercado cada vez mais exigente.